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domingo, 20 de fevereiro de 2011

Dude, we´re LOST!



Eu respirei fundo depois de escrever a matéria, publicada na Folha (confira aqui), sobre a estréia da última temporada de LOST na Globo. Eu não gostei do final da série, e sabia que a crítica ia causar uma certa repercussão. Para minha surpresa, foram mais palavras positivas de "é isso mesmo, foi zoado o final" e "ainda bem que eu parei de assistir na terceira temporada" do que críticas de fãs nervosos. Lógico que houve quem discordasse, e é bacana isso, eu apóio as discussões sobre séries, mas um email que eu recebi me chamou particularmente a atenção.

Uma leitora (vamos chamá-la de, sei lá, Kate) indicou que todas os mistérios da série tinham sido solucionados, e eu que havia comido 'barriga' para não ver isso. Ou seja, em algum lugar dentro dos extras da sexta temporada e dos últimos episódios da série todos os mistérios (sim, TODOS) tinham sido solucionados. No final do e-mail, ela me chamou de um idiota incompetente.

Tudo bem me chamar de idiota - eu não discordo, sou meio idiota - mas fiquei encucado com essa de não ter 'sacado' o que havia acontecido na ilha. Eu não ia me perdoar se houvesse perdido algum mistério nessa série desgraçada. 

Então fui eu lá, assistir os últimos 3 capítulos, entrar na LostPedia denovo, assistir novamente os extras de 12 minutos chamado "The Man In Charge" e no final dessa maratona não encontrei absolutamente nenhuma respostinha, nem uma simples dica do que diabos havia acontecido naquela ilha do capeta. 

Depois disso eu, calmamente, me dirigi até o computador e redigi uma resposta para a leitora. 
Ele está abaixo:


Para: ***************@hotmail.com

Prezada Kate

Quando eu coloquei o ponto final na matéria "Era uma ilha muito engraçada...", já imaginava que pudessem haver reações; eu próprio me considero - apesar de todos os pesares - um fã de Lost, e acredito que a série realmente mereça o status que atingiu. Foi revolucionária, apesar de quase se estragar no final. Mas essa é uma opinião.

Acredito que o jornalismo cultural, acima de todos os outros, qualifica-se especialmente por essa diversidade que surge de uma discussão nada parcial. A arte é, fundamentalmente, causadora de conflitos: como dissecar 'racionalmente' um produto que é feito, grosso modo, para te emocionar em algum nível subjetivo? No fundo, a crítica da arte sempre vai esbarrar na pura opinião.

Eu acompanhei todos os episódios de Lost, e admito que fiquei incodicionalmente viciado por aquilo. Contava os dias para chegar um novo episódio que me revelasse um novo flashback cinematográfico feito para descascar (como uma cebola) a personalidade dos sobreviventes. Eu adorava a série. Para mim, J.J. Abrams (que também dirigiu Cloverfield e Missão Impossível 3) é um dos melhores nomes da nova geração de cineastas.

Mas, em algum momento, entre a temporada 4 e 5, o seriado abriu mão da sua maior força - a profundidade dos seus personagens - para embarcar em uma mitologia fraquinha e maniqueísta: o bem contra o mal. A fumaça contra o Jacob. O cara de preto contra o de branco. Esse foi o começo do fim daquela série que eu gostava tanto.

No seu email, você escreveu que as respostas para a série estão nos extras da última temporada. Primeiramente, esta é uma estratégia muito utilizada pelos produtores de grandes séries (ou filmes) que não sabem como encerrar a história. Eles lançam o produto no mercado, observam a reação do público - que, em Lost, foi extremamente negativa (vide artigo do L.A. Times http://articles.latimes.com/2010/may/24/entertainment/la-et-lost-review-20100524 ou do NineNewshttp://news.ninemsn.com.au/entertainment/1057102/fans-slam-lost-finale-as-worst-ever ) e tentam 'remendar' ele depois, com extras e material inédito. Isso é meio praxe em Hollywood.

Em segundo lugar, os extras do box, o mini-episodio de 12 minutos intitulado "The Man in Charge", apenas arranha as questões da série - meio que resolve o urso polar e ressuscita a importancia do Walt em 'voltar para a ilha', mas nenhuma resposta é oferecida. - Lógico que daí sobra espaço em foruns de discussão e pano para manga para anos e anos de teorias, mesmo assim, oficialmente, no Lost nada é resolvido. - voce já deve conhecer o site lostpedia.com, se não, é ótimo, vale a pena dar uma conferida.

Mesmo assim, teve muita gente que adorou o final da série. Eu lembro que sempre entrava nessa discussão com um grande amigo meu, que fez pós em Cinema comigo. Ele dizia: "cara, não importa as respostas para os números e para Dharma. Tudo no Lost é baseado na redenção dos coitados da ilha", eu não concordava, mas respeitava imensamente a opinião dele de engolir esse sapo gigante e aceitar isso de 'ilha da redenção'.

Enfim, eu também me emocionei com Lost. Acompanhei todas as temporadas. E fiquei extremamente decepcionado o o final 'fácil' que os autores escolheram. Você já deve ter percebido, pelo tamanho do email, que eu adoro discutir sobre séries, especialmente séries tão boas quanto essa.

Sobre a outra parte do seu email, em que você julga minha competência como profissional, vou apenas relevar esses comentários e assumir que você estava genuinamente ofendida com um cara qualquer descendo a lenha na sua série preferida. Eu entendo isso, mas posso te garantir que minha competência como jornalista, estudioso de filosofia e de direção cinematográfica, me habilita a discutir em um nível bacana sobre esses assuntos. Na Folha eu tenho uma liberdade editorial fantástica para falar com os leitores sobre isso, e na maioria das vezes - não no seu caso - eles gostam das resenhas.

Eu peço desculpas se te ofendi de qualquer outra maneira, e fico feliz com sua crítica, porquê o tema de uma série legal como Lost deve ser sempre discutido mesmo. Sinta-se a vontade para me enviar quaisquer outras críticas e/ou sugestões. Mas sem fanatismo - futebol e religião não se discute.

Att.
Rafael Ceribelli - Folha2
rafael_ceribelli@hotmail.com / folha2@folhadelondrina.com.br
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abraços!