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domingo, 11 de maio de 2008

O Velho


O vento frio soprava nos arredores da pequena praça no centro de uma cidade qualquer, e as folhas caídas enchiam as ruas naquele fim de tarde do outono. Sob o tom laranja que preenchia o céu, as estrelas que começavam a aparecer eram observadas pelo olhar melancólico do homem sentado sozinho em um dos balanços do velho parque abandonado.

Submerso em seus pensamentos em meio ao silêncio sepulcral, que era apenas quebrado pelo barulho metálico do movimento das correntes do balanço, o homem, curvado sobre si mesmo, se viu repentinamente tomado de assalto das memórias e das sensações que pertenciam àquele lugar, momentos atemporais, detalhes insignificantes, esquecidos, mas que continuaram gravados em sua alma.

Sua infância, assim como uma seqüência de fotos, passou diante de seus olhos, e o cheiro do desejado carrinho de algodão-doce que existia no parque serviu como pano de fundo àquela aventura rumo ao desconhecido que o inquieto garoto loiro estava prestes a iniciar; ao longe, um grupo de outros garotos, reunidos e equipados com figurinhas e bolinhas de gude, conversava animadamente.

Com passos indecisos, mas talvez até mais corajosos que o de Armstrong ao pisar na lua, o tímido garoto se aproximou. O grupo se calou e todos prestaram atenção no novo vizinho do bairro; os segundos de hesitação pareciam uma eternidade, mas o menino disse finalmente as palavras mágicas: “Posso brincar com vocês?”

Dias felizes. Brincar com os velhos amigos, que continuariam sendo amigos para sempre, companheiros de vitórias e derrotas, nas alegrias e tragédias comuns da vida. Dormir afundado nos cabelos encaracolados de sua mãe; as conversas na varanda com seu pai, o cheiro de seu charuto e seus bonitos acordes no violão. Observar as mesmas estrelas, sonhando ser um astronauta. O seu primeiro amor, o único verdadeiro, aquela menina morena que fazia sua voz entalar na garganta toda vez que sorria, e o beijo que, por um segundo, fez o tempo parar.

Idiossincrasias da vida; tudo o que realmente importa.

Ao retornar de seus devaneios, o velho de cabelos brancos, novamente sozinho em seu balanço preferido, tinha os olhos cheios de lágrimas. Seu tempo havia chegado ao fim, e agora não lhe restava mais nada além de um coração cheio de cicatrizes e o inevitável vazio de sua existência.

Ele era feliz, mas acabou crescendo.

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